Somos corpo-território – 07/03/2025 – Txai Suruí



Dia 8 de março é o Dia Internacional da Mulher e de fato não é fácil ser mulher neste mundo, ainda mais se você for uma mulher indígena. Ter essa conversa, se tratando de mulheres indígenas ou não indígenas, também não é fácil pois gera debates, divergências e desconforto.

Como mulheres indígenas, enfrentamos a discriminação, a exclusão da vida pública e a violência, seja ela institucionalizada ou aquela que atenta contra nossos corpos. Hoje, temos de viver sob o modo de vida do não indígena tendo também o nosso modo de vida muitas vezes violado.

Os casos de feminicídio de mulheres e adolescentes indígenas no Brasil aumentaram 500% entre os anos de 2003 e 2022. As vítimas são predominantemente jovens, solteiras e com menor escolaridade. Foram registrados no total 394 homicídios de mulheres indígenas.

Esses são dados do Relatório Técnico sobre Homicídios contra Mulheres e Adolescentes Indígenas no Brasil, desenvolvido pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) com o Ministério dos Povos Indígenas.

No entanto, essa violência contra nós, mulheres, não é algo cultural, mas que veio com o machismo e o patriarcado que entraram em nossas comunidades com a colonização e que se fortalecem com esse neocolonialismo que insiste em querer nos exterminar.

O roubo dos nossos territórios, a perseguição de nossas espiritualidades e crenças, a perseguição dos nossos direitos transformaram e transformam nosso modo de ser, e a omissão do estado permite que isso se perpetue.

Na busca por nossos direitos, para que nossas vozes sejam ouvidas e para ocuparmos os espaços, acabamos, como mulheres indígenas, por ultrapassar nossos limites. Por exemplo, nós, mulheres da etnia paiter, durante a menstruação, devemos ficar de resguardo, e há regras as quais devemos seguir, mas para estar em espaços públicos, nas universidades ou como funcionárias, não conseguimos segui-las, pois esse sistema ainda não entende nosso modo de ser.

É importante que isso seja dito para que exista também o debate, por isso trago a fala de Sandra Benites, mulher guarani, em “Cadernos Selvagens”, que traz essa mesma vivência e nos toca:

“Nós, mulheres, somos as mesmas, somos um corpo só. Por isso, eu digo: muitas vezes, quando eu me vejo em algum lugar, como todas as mulheres, independentemente da origem, da etnia, eu me encontro. Não me encontro quando é algo que vem de fora, que é imposto para nós, mulheres. No caso, por exemplo, das cidades, onde as mulheres têm dificuldade de existir com o seu próprio corpo enquanto mulheres, enquanto mulheres que sangram, enquanto mulheres que têm filhos.

Então, você nega totalmente o seu próprio corpo, entra no sistema que foi direcionado só para um corpo masculino. Vários sistemas: escola, universidade e outras coisas que a gente sabe que enfrenta. Esse processo, que vai dizer a você quem é você, na verdade, é um processo —não é uma coisa que nasce pronta ou que, por alguma razão, a gente é aquilo”.

Somos protagonistas de uma luta ancestral pela preservação de nossas culturas, modos de vida e territórios. Somos corpo-território.


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