Em um belo domingo, sentei-me à varanda para ler a Folha com calma. Deparei-me com texto da colunista Ana Cristina Rosa (“Simples assim”, 16/2) e, antes mesmo de abri-lo, sabia do tema que seria tratado: racismo, cotas, discriminação etc. Ana Cristina Rosa é uma colunista monotemática, para quem os fenômenos mais complexos podem sempre ser explicados através da lente simplória do “racismo estrutural” —e tudo, absolutamente tudo, é reflexo de relações raciais.
Eu não estava errado. A monomania de Ana Cristina Rosa nunca falha. Mais uma vez ela se propôs a explicar ao leitor o quão racista é a sociedade brasileira (e a sociedade ocidental), dominada por uma elite escravocrata cujo único propósito é manter os negros submissos. A tal da “elite” é bem parecida com um vilão de desenho animado, que dá risadas caricatas ao expor o seu plano maléfico.
Desta vez, porém, tive uma surpresa ao ler o artigo (sim, até os colunistas mais previsíveis, que só conseguem tratar de um tema, podem nos surpreender de vez em quando): Ana Cristina me citou. Não diretamente, claro, mas ela deixou implícita a menção à minha pessoa quando disse que dois deputados do União Brasil haviam apresentado projetos de lei como resposta à decisão do Superior Tribunal de Justiça, que decidiu que a lei antirracismo só protege os negros. E disse que é triste saber que algumas pessoas não enxergam isso.
Eu sou um desses deputados que Ana Cristina mencionou. Como deputado estadual, não tenho competência para legislar sobre direito penal, mas apresentei um projeto de lei para alterar a lei antirracismo do estado de São Paulo (que prevê sanções administrativas) e garantir que todas as pessoas tenham a mesma proteção e que todos os que incorrem em conduta racista sejam igualmente punidos. O segundo parlamentar mencionado é, presumivelmente, meu amigo e companheiro do Movimento Brasil Livre, o deputado federal Kim Kataguiri, que apresentou projeto de lei para mudar a lei antirracismo federal e garantir que ela fosse aplicada para a proteção de todos, diferentemente do que o Superior Tribunal de Justiça decidiu.
Além de deputado, sou um homem negro. Sei que existe racismo e sei que uma das formas de ele se expressar é pela construção de uma senzala ideológica, em que a minha cor de pele determina o que devo pensar, como devo agir e em quem devo votar. Há anos a esquerda brasileira tenta prender os negros (como eu) nessa senzala. Os que buscam uma alforria ideológica são prontamente punidos pelo açoite dos membros da Casa Grande esquerdista, que não admite qualquer divergência.
Desde 2023, exerço o meu mandato e, nesse curto período, já fui vítima de ofensas raciais das mais diversas, proferidas em meio presencial ou eletrônico. Todas elas têm uma coisa em comum: foram proferidas por militantes de partidos de esquerda, que se acham no direito de expressar ofensas racistas quando um negro não adere à sua cartilha ideológica.
Aos militantes de esquerda, que tantas vezes proferiram ofensas racistas contra mim, e à colunista, digo: não adiro à sua cartilha e não vou aderir. Acho que todas as pessoas são iguais. Acho que a lei deve proteger e punir a todos igualmente. A ideia de que a lei faça distinção entre pessoas por conta da cor da sua pele é, para mim, abominável. A lei antirracismo (federal e estadual) deve proteger a todos e punir qualquer pessoa, de qualquer cor, que incida em conduta racista.
Essa ideia de igualdade, tão simples e tão bonita, é considerada herética pelos sacerdotes da esquerda, que levam os divergentes à fogueira do cancelamento, da perseguição e do linchamento público. Por meio do medo, a esquerda consegue calar qualquer voz dissonante e dizer aos negros o que pensar e como agir.
Sinto informar à monotemática colunista, mas nós do Movimento Brasil Livre estamos promovendo uma revolta igualitária. Queremos uma sociedade em que ninguém seja classificado pela cor da pele e qualquer pessoa que viole a lei seja punido. Uma sociedade sem castas. Uma sociedade em que negros, brancos, indígenas e demais pessoas sejam vistos como indivíduos e julgados de acordo com suas ações, seu mérito e seu caráter, exatamente como Martin Luther King Jr. sonhou.
Sugiro à colunista que retifique o título do seu texto. Em vez de “simples assim”, deveria chamar-se “simplista assim”.
TENDÊNCIAS / DEBATES
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