Quase 7 em cada 10 moradores dizem que deixariam a cidade de São Paulo se pudessem. Por que a cidade mais rica do país e que oferece tantas oportunidades, conhecimento e cultura é reprovada pela grande maioria da população? Provavelmente porque os problemas estruturantes são maiores do que os benefícios oferecidos. Em síntese, as tensões superam os prazeres.
Em São Paulo, a oferta de trabalho é ofuscada pela insegurança, problema apontado como o mais grave por três em cada quatro moradores. A espera de 78 dias na média para uma consulta com um especialista faz esquecer os shows oferecidos. E o tempo médio gasto no trânsito, de duas horas e meia por dia, reduz as possibilidades de encontros, lazer e acesso a cultura. São dados da pesquisa de Qualidade de Vida em São Paulo, lançada nesta semana pelo IPEC, Instituto Cidades Sustentáveis e Rede Nossa São Paulo, em parceria com o Sesc.
Os maiores problemas apontados são segurança, saúde e transporte coletivo, nesta ordem. Em relação à avaliação da qualidade de vida, a população está dividida: piorou para quase um terço e melhorou para outro terço dos moradores.
A verdade é que para enfrentar em escala os problemas, somente através da política. Mas o problema é que a pesquisa mostra o enorme distanciamento da população da política. Dois em cada três eleitores não se recordam em quem votaram para deputado federal e senador nas eleições de 2022. A memória é fraca para a política, talvez como uma reciprocidade inconsciente da população cansada de esperar por melhorias que não se concretizam: preferem esquecer.
Dois terços declaram não querer participar da vida política da cidade, o que é chave para uma mudança. Mas um terço quer. Por isso, ocorreu no Theatro Municipal a cerimônia de posse de 591 conselheiros e conselheiras do Conselho Participativo Municipal (CPM). Um importante passo para a participação social na cidade. O próximo será o de valorizar e dar mais poder aos CPMs, pois uma cidade com as dimensões de São Paulo não resolverá seus problemas se não estabelecer processos participativos eficientes. A alternativa é continuar enxugando gelo e os mapas de desigualdades da cidade não enganam: em 2006 a diferença da idade média ao morrer entre dois distritos, um rico e um pobre, era de 24 anos. Hoje, passados 18 anos, a diferença é a mesma.
As questões ambientais foram apontadas por uma em cada dez pessoas como o maior problema da cidade. Percebe-se um crescimento da consciência da população em relação aos impactos da mudança climática. Os trágicos eventos ocorridos no Rio Grande do Sul combinados com a histórica seca do norte despertam temores e consciência nas pessoas. O forte impacto das chuvas desta sexta-feira (24) em São Paulo evidenciam que a cidade não está preparada para eventos extremos e deve priorizar sobretudo ações para proteger as 71 mil pessoas que moram em áreas de risco na cidade.
São enormes os desafios de uma cidade com as dimensões de São Paulo, mas uma coisa é certa: somente uma mudança de prioridade de investimentos combinada com uma efetiva descentralização política pode trazer esperanças para as transformações estruturantes que a cidade necessita.