Benjamin Netanyahu vem sendo pressionado há meses por aliados políticos e pelas famílias dos reféns para acabar com a guerra em Gaza. Agora, com o acordo de trégua, o primeiro-ministro israelense espera permanecer no poder, dizem os analistas.
O governo israelense ainda não deu sua aprovação ao acordo anunciado na quarta-feira pelo Catar e pelos Estados Unidos.
Na manhã desta quinta-feira, ele o condicionou à resolução de uma “crise” de última hora provocada pelo Hamas, que, de acordo com o gabinete de Netanyahu, “recuou em alguns pontos”. O movimento islamista negou categoricamente o fato e disse que mantém o acordo anunciado.
Durante os mais de 15 meses de guerra em Gaza, desencadeada pela ofensiva do Hamas contra Israel em 7 de outubro de 2023, Netanyahu foi duramente criticado em seu país por não ter conseguido impedir o ataque e por não ter feito o suficiente para libertar todos os reféns.
Ele também foi acusado de prolongar a guerra para permanecer no poder e escapar de processos por corrupção.
Cerca de 800 pais de soldados que lutam em Gaza lhe enviaram uma carta no início deste mês dizendo que não podiam mais “permitir que o senhor continuasse a sacrificar” seus filhos “como bucha de canhão”.
Mais de 400 soldados foram mortos no território palestino desde o início da guerra.
Mas os membros de extrema direita da coalizão de Netanyahu ameaçaram deixar o governo se um cessar-fogo for assinado e pressionaram por uma resposta israelense ainda mais dura em Gaza.
– Explorando o acordo –
Os analistas acreditam que é improvável que as controvérsias em torno da guerra de Gaza e seu resultado derrubem um homem que é considerado um mago da política e que é o primeiro-ministro que está há mais tempo no cargo na história do Estado de Israel.
Muitos concordam que “Bibi”, como o primeiro-ministro é popularmente conhecido em Israel, provavelmente encontrará uma maneira de capitalizar o acordo de cessar-fogo e talvez se distanciar da extrema direita.
O acordo poderia até mesmo abrir caminho para a normalização das relações com a Arábia Saudita, uma meta há muito tempo buscada e apoiada pelo presidente eleito dos EUA, Donald Trump.
“A questão é o que Netanyahu ganha com o acordo, além da libertação dos reféns e do cessar-fogo”, disse Anshel Pfeffer, jornalista e autor de uma biografia do primeiro-ministro.
É possível que o acordo de Gaza “seja parte de algo muito maior”, porque “Trump quer um acordo” entre Israel e a Arábia Saudita, o que levanta “a questão do legado” que Netanyahu deixará para trás.
– “Isso continuará a assombrá-lo” –
Depois de praticamente esmagar seus inimigos, Gayil Talshir, cientista político da Universidade Hebraica de Jerusalém, disse que Netanyahu talvez não precise mais contar com a extrema direita.
O ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, e o ministro da Segurança, Itamar Ben Gvir, são ambos membros da extrema direita do gabinete de Netanyahu e expressaram oposição ao acordo.
“É bem possível que Smotrich e Ben Gvir não façam parte de tal acordo” e que “Netanyahu esteja se preparando para esse dia”, disse Talshir.
O analista lembrou que várias figuras da oposição, incluindo seu líder Yair Lapid, já indicaram que trabalhariam com Netanyahu se ele chegasse a um acordo para libertar os reféns.
Para Aviv Bushinsky, comentarista político e ex-chefe de gabinete de Netanyahu, a turbulência política em torno do cessar-fogo “não muda a situação”.
Mas ele acredita que o legado de Netanyahu será manchado pelo dia 7 de outubro e pelo destino dos reféns, alguns dos quais, segundo ele, talvez nunca sejam encontrados.
“Ele vai querer que as pessoas se lembrem dos que ele conseguiu trazer de volta, e não dos que não conseguiu”, mas “isso continuará a assombrá-lo”, prevê.
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