Musk e Reich do Silício veem com Trump utopia sem regras – 25/01/2025 – Celso Rocha de Barros



A expressão “Reich do Silício” foi criada pelo jornalista Corey Pein em um texto publicado no site The Baffler sobre ideias autoritárias que começavam a fazer sucesso no Vale do Silício. Em 2014, quando o artigo saiu, parecia um exagero retórico para criar um bom título.

Não é mais o caso.

Elon Musk, o homem mais rico do mundo, aproveitou a posse de Donald Trump, o homem mais poderoso do mundo, para anunciar sua adesão às ideias da extrema direita europeia dos anos 30.

Só há uma interpretação possível para a saudação de Musk, e é a óbvia. Se você discorda, repita o gesto dentro de uma Sinagoga e veja se alguém não entende do que se trata.

Mas Musk não era o único representante do Reich do Silício na posse de Trump. Como mostrou Patrícia Campos Mello em matéria publicada nesta Folha em 24 de agosto, o novo vice-presidente americano, J.D. Vance, é um entusiasta das ideias autoritárias que prosperaram entre os bilionários da tecnologia.

Vance já citou com aprovação Curtis Yarvin, que assina seus posts como Mencius Moldbug. Yarvin defende que os americanos superem sua “ditadorfobia” e aceitem o governo monárquico de um CEO. Afinal, diz ele, as empresas são mais eficientes que os governos.

Dá vergonha ter que refutar, mas vá lá: o que faz as firmas eficientes são as instituições do mercado, a competição, o vasto volume de informação transmitido pelos preços. Onde isso tudo é impossível, ou por algum motivo indesejável, o governo deve agir.

Se você colocar um CEO governando um Estado, ele não vai poder contar com o mercado para lhe dizer o que fazer; daí em diante, suas chances de sucesso serão as mesmas de qualquer político.

Mas o principal inspirador do novo vice americano é Peter Thiel, um grande investidor da indústria de tecnologia. Em 2009, Thiel escreveu um artigo para o think tank conservador Cato Institute em que declarou que não acreditava mais que a liberdade e a democracia eram compatíveis.

Era 2009, um ano depois da grande crise de 2008, da qual o mundo, e a legitimidade da democracia, ainda não se recuperou. A crise foi inteiramente causada pela falta de regulamentação do setor financeiro privado, o que gerou nos eleitores um interesse maior pela intervenção estatal na economia. Foi isso que deprimiu Thiel, que obviamente achava que a crise tinha sido causada pelo governo.

Na verdade, Thiel lamentava que as condições para o exercício da liberdade já viessem se enfraquecendo desde a década de 20. Duas coisas teriam dificultado o sucesso eleitoral de libertarians como ele: o aumento do número de recipientes de programas sociais e a conquista do direito ao voto pelas mulheres.

Diante desse quadro, Thiel propunha três saídas: o ciberespaço, que ainda era terra de ninguém, a expansão para outros planetas e o seasteading, a criação de países artificiais no meio do oceano em que a utopia libertarian pudesse ser implementada.

Pessoalmente, sou um grande defensor de que idiotas se mudem para plataformas de petróleo abandonadas em águas internacionais, porque isso em geral é longe de onde eu estou.

Mas Musk, Thiel e o resto do Reich do Silício encontraram em Trump uma chance de realizar em território americano sua utopia sem regras nem democracia.


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