É necessário um debate sobre o uso do celular na escola – 20/01/2025 – Opinião


Em dezembro foi sancionada a lei que proíbe o uso de celulares e outros dispositivos eletrônicos pelos alunos nas unidades escolares públicas e privadas do estado de São Paulo. Neste janeiro, coube ao presidente da República sancionar uma lei similar com o objetivo de limitar o uso de aparelhos eletrônicos portáteis, inclusive telefones celulares, nos estabelecimentos de ensino de todo o território nacional.

A proibição do uso desses equipamentos na escola é, no mínimo, polêmica e deve ser analisada sob as perspectivas política e pedagógica.

Do ponto de vista político, vivemos uma época na qual a cultura digital está definitivamente instalada e sua expansão e aprofundamento têm sido patrocinados por inúmeras instâncias, dentre elas, o poder público e os sistemas de ensino. Chega a ser curioso lembrar que a proibição do uso de celulares durante as aulas nas escolas estaduais de São Paulo já fora determinada pela lei 12.730/2007. Também causa estranheza o fato de as leis em questão passarem ao largo da responsabilização pela guarda dos aparelhos do horário de entrada até o horário da saída.

Sensíveis à realidade, tanto a legislação paulista quanto a federal permitem o emprego de dispositivos eletrônicos como ferramentas pedagógicas específicas. Observações sistemáticas em escolas públicas ao longo de 2024 evidenciaram práticas inovadoras e inventivas em sala de aula com o uso dos celulares. Inúmeras vezes, o apelo a esse equipamento foi necessário para acessar à internet porque a rede da instituição estava indisponível. Não raro, o professor roteava o próprio plano de dados ou o de algum aluno para que a turma pudesse assistir ao vídeo do YouTube que permitiria realizar a atividade planejada ou consultar informações acerca do objeto de ensino de sua disciplina.

Apesar da preocupação legítima com a conexão entre a saúde mental e o uso exagerado de celulares, urge reconhecer que o sofrimento psíquico dos estudantes possui uma dimensão bem mais complexa, devendo receber a atenção de políticas públicas que possam reduzi-lo com base em conhecimentos científicos.

Historicamente falando, a escola moderna surge no mundo ocidental atrelada à cultura impressa. A invenção da imprensa barateou o preço dos livros, tornando-os mais acessíveis. Em simultâneo, a Reforma Religiosa e o Renascimento favoreceram o surgimento de colégios e escolas de caridade que familiarizavam as novas gerações com a cultura letrada.

A partir do final do século 18, os Estados-nação se apropriam das instituições escolares, homogeneizando os currículos sem, entretanto, abrirem mão de boa parte dos métodos prioritariamente apoiados em livros didáticos.

Desde o final do século 19 e ao longo de todo o século 20 houve iniciativas voltadas à interpelação desse primado da cultura impressa: os recursos audiovisuais como mimeógrafos, projetores de slides, retroprojetores e similares, além do cinema e televisão na escola. Tais expedientes didáticos, ao mesmo tempo que complementavam, se contrapunham à cultura impressa. Mas nenhum deles chegou a confrontar tão violentamente a primazia do texto tipográfico, fenômeno que se constata na atualidade com a cultura digital.

Cabe lembrar que as tecnologias mencionadas, além de bem recebidas, qualificaram as atividades de ensino. Por essa razão, traz perplexidade a proibição legal pura e simples do celular, o que fere algo muito caro aos educadores: a autonomia escolar. Assim como a sala de aula dialogou e acolheu primeiramente o livro e, mais tarde, o computador, era de se esperar que o mesmo ocorresse com os aparelhos celulares. A questão é que o regramento para o uso precisa ser debatido e acordado entre gestores, docentes, estudantes e suas famílias.

Diante da obrigatoriedade do cumprimento da lei é imperioso que os poderes públicos criem canais de comunicação que discutam e aprimorem medidas com a finalidade de garantir que se faça um bom uso pedagógico dos aparelhos eletrônicos portáteis.

TENDÊNCIAS / DEBATES

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