E a Fernanda Torres, hein? – 01/02/2025 – Antonio Prata



Sei que falei de “Ainda Estou Aqui” na semana passada, mas não peço desculpas por me repetir. Muito pelo contrário: pretendo escrever sobre o filme e as indicações ao Oscar até o dia da cerimônia, 2 de março, data que se tornará feriado nacional, per saecula saeculorum.

Por quê? Porque essa é a primeira boa notícia na praça, em muitos e muitos anos. Os donos do mundo fazendo “Heil, Hitler!”, golpistas à solta no Brasil, bullying pesado nas escolas, gente pobre perdendo tudo para essas bets calhordas, a temperatura subindo, corais morrendo, florestas e cidades queimando, São Paulo inundando, minha vista cansada piorando num ritmo que já me refiro a ela como vista exausta; mas é só pensar na Fernanda Torres e o sol da felicidade em raios fúlgidos volta a brilhar no céu da pátria neste instante.

Num almoço de domingo, a família se digladiando sobre política, basta alguém falar “E a Fernanda Torres, hein, gente?”: as faces congelam, como se Deus tivesse apertado o pause no celular de onde assiste a esta série torpe chamada “Humanidade”. Então, em slow-motion, as rugas vão dando lugar a sorrisos, as rusgas são solapadas pelo otimismo. Até a Regina Duarte, pessoal, a Regina Duarte, que durante anos foi uma biruta política —bastava saber pra que lado ela estava tremelicando e ir pro outro— declarou numa entrevista estar encantada com o filme. Daí pra Carla Zambelli postar um #SOMOSTODOSNANDA e dar três tiros pro alto é um pulinho.

Sexta-feira assisti ao filme pela segunda vez, agora com minha filha, de 11 anos. Achei que não precisava levar um pacote inteiro de Kleenex, como na estreia. Ledo engano. Não queria ir pegar papel higiênico no banheiro e deixar minha filha sozinha diante de agentes da repressão, mas se desse mais uma fungada minha sinusite ia parar no calcanhar. A gente se vira como pode: discretamente, tirei o tênis, a meia… Quando acenderam as luzes, minha filha perguntou, “papai, por que tem talco no seu nariz?”. Eu disse que devia ser o sal da pipoca.

Acho que o grande acerto do filme, para além da destreza samurai de todos os profissionais envolvidos, é focar na vida, não na morte. Poderia ser uma história sobre a violência da ditadura, sobre a injustiça, a covardia, “Não Estou Mais Aqui”, mas é o contrário. É uma história sobre a força luminosa daquela família, encabeçada por Eunice Paiva. A linda fotografia trabalha neste sentido. Começamos na praia e ensolarados vamos até o momento em que os carniceiros entram na casa e fecham as cortinas. O breu permanece até Eunice sair da prisão e escoa pelo ralo na belíssima cena do banho. Dali em diante, apesar das trevas em que os Paiva são atirados, o sol volta a brilhar. Terminamos com a luz refletida nos tacos da casa.

Eu poderia fechar a crônica falando sobre o absurdo que é aqueles assassinos terem saído ilesos e de como a impunidade nos levou a que a história quase se repetisse (não como farsa) no dia 8 de janeiro de 2023. Prefiro, contudo, seguir a lição do filme e acabar o texto sob o sol, dizendo que não estou preocupado com a campanha pelo Oscar de melhor filme, melhor filme estrangeiro e melhor atriz, que deve ser transmitido num telão, no sambódromo do Rio de Janeiro. Eu vejo além. Tô focado é na campanha da Fernanda Torres para presidente. Walter Salles, ministro da Cultura. João Moreira Salles ou Marcelo Rubens Paiva na Educação. Algum irmão banqueiro cuidando da economia. E o Andrucha Waddington como o primeiro primeiro-damo na história deste país. Agora vai, Brasil!


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